(uma história verídica na casa da fonoaudióloga, quarta-feira, setembro de 2020 )
Tempo de pandemia. sento no sofá, no espaço onde minhas filha estão fazendo tarefas e aulas online, para ler alguns textos, pois estou organizando meus arquivos e livros aqui. É mais um tempo de estarmos juntas, mesmo quando cada uma faz sua atividade. Alguns comentários escapam ao longo da tarde e são respondidos em uma comunicação cheia de cumplicidade.
Quando a aula de português termina, minha filha, que tem se empenhado muito em melhorar a leitura e seus desafios, exclama:
- O professor deixou uma frase pra gente pensar: "A gargalhada é o sol que varre o inverno do rosto humano." O que significa isso?
- Vamos ler devagar e pensar o que pode significar, filha...?
Ela lê bem devagar, analisando e comentando cada palavra. De repente ela abre um sorriso:
- Quer dizer que a tristeza vai embora e a alegria vem como o sol???
Há alguns minutos o sol tinha aparecido na cinzenta Curitiba e arrancou de nós suspiros e comentários de que ficaria mais quentinho.
Dessa vez fui eu que sorri ao ver o rostinho surpreso com o significado escondido entre as palavras. Eu tinha acabado de ler um antigo texto que dizia que a linguagem escrita não tem que necessariamente explicar completamente a situação para ser intelegível. Se pensarmos na literatura, na poesia, podemos perguntar : em que contexto a linguagem é ou pode ser sugestiva, remissiva, provocadora? (1)
Isso resulta em ampliar os significados da leitura para muito além de decodificar letras combinadas e reconhecer o padrão linguístico aplicado.
É mais. É inserir seres humanos em múltiplos contextos e revelar a eles várias possibilidades e mundos.
Textos citados :
(1) SMOLKA, A.L.B. A criança na fase inicial da escrita - alfabetização como processo discursivo. Cortez, 1999.
Imagem: Freepick
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